"em que idade do coração se apaga o riso dos homens?"
Al Berto

Monday, December 31, 2012

Só mas livre. Esta sou eu. Aqui verdade nua perante todos. Gorada a tentativa desesperada de me mudares e me tornares em algo que não eu; um objecto estático respondendo "sim" e "não". Esta sou eu: crua, dura, livre. E só. Sempre só a trilhar o meu caminho. Caminho sempre, sem nunca parar ou olhar para trás. Larguei-te a mão. Essa mão que me agrilhoava tentando fazer de mim algo que não sou. Gritei-te: "Sou livre!" Palavras que te feriram os ouvidos. Por isso estou só mas livre e ainda dura e crua.

Não quero saber de palavras


Não quero saber de palavras
Não quero saber de palavras
Escritas…
Faladas…
Quero silêncio, …
Nem um murmúrio.
Não quero saber de coração,
Sentido,
Tocante ou não.
Quero alma,
Alma minha que se foi
Quero alma,
                para ainda buscar,
                para a deixar dançar.
Quero alma para ser
E outra para fazer.
Escrevo um verso num copo
Quero viver…
                Mas os sóis que se vão
                Não servem para nada.
                Quero lua, estrela sempre fria
                Lua que se torna quente em mim.

Sunday, December 30, 2012

Tenho ainda presente os teus olhos nos meus, fixando-me num pedido constante de afecto. E a tua mão pegando na minha suavemente. Depois de sairmos do restaurante descemos a rua do Alecrim, como tantas vezes depois haveriamos de fazer, de mãos dadas. Sempre de mãos dadas. E eu pensava que tu não  me querias largar. Mas era eu, meu amor, era eu que não te queria deixar. Era eu que apertava a tua mão com força para a não largar. Querias dizer-me algo mais quando frente a frente, junto ao Cais do Sodré, esquecendo todos os que por nós apressadamente passavam, nos despedimos. Eu também queria dizer algo mais. Não sabia, contudo, o quê. Por essa razão apenas te sorri e desejei, desejei abraçar-te e beijar-te. E tu desejaste o mesmo mas não o disseste, nem o fizeste. Os teus olhos despediram-se de mim, os meus de ti. Separamo-nos com o coração a palpitar, vivos como nunca antes. 

De regresso a casa, no comboio, aninhei-me em mim e depois sorri ao ler a mensagem de telemóvel por ti enviada. Foi assim que percebi que te amava.

Saturday, December 29, 2012

Tudo para ser feliz - 1


Fechou os olhos e esperou… esperou que tudo fosse mentira, “um pesadelo” como já tinha ouvido tanta vez! Mas não era, abriu lentamente os seus olhos cansados e lá estava tudo, os móveis, os papéis, tudo! Sentou-se agoniada, correu para a casa de banho e vomitou mais uma vez. Não estava grávida, não estava doente, não estava enjoada com um cheiro qualquer, não! Estava cansada e não sabia qual o passo que deveria dar a seguir… Pensou no seu quarto de menina e como gostaria de lá se refugiar neste momento, em todos os momentos! Lembrou-se do poema de Mário de Sá Carneiro: “Perdi-me dentro de mim…”, e essa era a grande verdade da sua vida, estava perdida, algures num lugar distante que não ali, não naquela secretária, não naquela cidade, não com aquelas pessoas. Doía-lhe a cabeça! Os colegas falavam com ela e, no entanto, não os conseguia ouvir, virou costas e foi chorar escondida na sala do café, rezando que ninguém lhe aparecesse e fizesse perguntas. 

Sentir as palavras!

O que sou obrigada a sentir?
Pensamentos e ideias,
Pensamentos que se transformam em palavras.
As palavras sinto-as
Com as folhas que se perdem das árvores,
Vermelhos, laranjas, cores sem fim.
O que sou obrigada a sentir?
Folhas e livros,
Palavras que nascem na primeira estação.
Brilha o sol, flores e sementes,
São palavras, amigos
Que me obrigam a sentir

Isabel Miguel also known as The Green Fairy

Friday, December 28, 2012

Há uma porta aberta por onde o sol espreita. Há uma janela semi-cerrada por onde ainda te vejo a caminhar a passos largos para longe de mim. Mas a porta aberta convida-me a sonhar, impele-me a gritar sem temores, sem receios e sem medos. Nessa porta aberta, ali ao fundo do corredor vislumbro quentes raios de sol irrompendo com violenta ternura nesta casa. A minha casa. Esta onde eu me encontro e me re-encontro. Esta casa onde tu estiveste, onde também sonhaste em minha companhia mas não comigo. De onde te foste, aonde não regressaste. Mas esta é a casa onde eu estou, onde eu fico. Onde eu quero ficar.

Sunday, December 23, 2012

Abri o meu coração e dele tudo brotou.
Abri-te o meu coração. Inundei-te de carinho.
Esvaziei o meu coração. E, contudo, olho para dentro de mim e sinto-me cheia, a transbordar de novos e inexplorados sentimentos.
Envolvi-te nesta profusão de loucura e ternura. Fazes parte desta doce teia.
As enormes vagas envolviam o pequeno barco e sacudiam-no de um lado para o outro furiosamente. O vento uivava e parecia sibilar palavras assustadoras aos ouvidos dos homens que tremiam. Pesadas gotas de chuva enchiam de água fria o barco. A tenebrosa escuridão da noite era, de quando a quando, iluminada pelo reluzir de um relâmpago no céu, seguido do temerário ribombar do trovão, que estremecia as madeiras do barco e penetrava fundo nos cérebros dos frágeis homens.

Visão assustadora. Presságio antigo de um fim do mundo que todos esperavam, incredulamente. A tempestade aumentava a sua fúria, as águas revoltas pareciam engolir as pequenas barcaças que, aqui e além, se encontravam perdidas na imensidão do mar revolto. Numa tentativa de sobrevivência desesperada, lançando as suas redes às águas, os homens buscavam somente as suas mortes, entregando-se sem no entanto o saberem. Pobres diabos.

A noite escura permitia, no entanto, visionar o horror estampado nos rostos curtidos pelo sol e maltratados pelo vento do mar. E os olhos, os olhos muito abertos, assustados, atentos a tudo. Os olhos antevendo, por fim, a desgraça.

Vozes irrompendo em rezas, muito baixinho, quase inaudíveis. Pedidos de salvação entre soluços disfarçados. Rostos duros amedrontados. Esgares patéticos. Medo. Desespero.

A praia iluminada por candeias aguardando a chegada dos homens. As mulheres ansiosas. Olhos fitos no mar... esperando. Terços nas mãos trémulas. Rezando. Esperança quase desvanecida.

Passada a tempestade ao fim da manhã, de novo o dia soalheiro abraçou a pequena praia, acariciando suavemente os rostos doridos das mulheres, sempre à espera. Vestidas de negro e curvadas sobre si mesmas devido ao cansaço da longa espera e do medo que ainda as dominava. O mesmo olhar ansioso tornado há muitas horas em puro desespero. Cada uma pensando que o seu homem não regressaria, mas desejando ardentemente que as suas preces fossem atendidas.

Ao longe as barcaças começaram a avistar-se. Uma a uma foram surgindo na linha do horizonte. Aproximaram-se lentamente do pontão. 

Os olhos ergueram-se para os céus. As vozes murmuraram agradecimentos. As vozes: "Deus existe! Deus é grande!" Choros do antecipado reencontro. Abraços vindos do fundo da alma, tão apertados que os corpos julgar-se-iam não se querer separar nunca mais.

Maria, bonita e loira de olhos claros, largos metros afastada da praia onde permanecera rezando à sua maneira, sorria olhando o marido como querendo reter a sua imagem para sempre gravada na sua memória. Largou a mão do filho e disse: 

- Vai, António, corre. Vai abraçar o teu pai.

* texto escrito em parceria com A.C.

Thursday, December 20, 2012

O Paradoxo dos Afectos

Na penumbra olho o teu rosto sereno enquanto dormes. Suave. Nem pareces respirar. Fico a olhar-te durante algum tempo e pergunto-me: "Quem és tu?" Aproximo uma mão do teu rosto. Quase te toco.

Não me lembro nunca de ter tido medo de tocar alguém como agora acontece contigo. Por isso me mantenho afastado. Deixo esta distância confortável entre nós ditar o afecto que nos une após seis anos juntos. Cá estamos nós. Tu, nua, deitada de lado, respirando suavemente virada para mim. Os cabelos  ondulados espalhados em completa revolução sobre a almofada. Eu, de boxers, deitado, também de lado, virado para ti, olhando-te, amando-te no silêncio da madrugada avançada. Depois fecho os olhos e adormeço.

Daqui a pouco o despertador vai tocar. Vais acordar a resmungar, dizendo que tens sono. Esticarás os teus braços, ainda de olhos fechados para me procurares. Depois vais aninhar o teu corpo no meu e ficar assim alguns segundos. Um beijo perder-se-á no ar. A seguir levantar-te-ás sem dizer palavra. Tomas um duche rápido, vestes-te. Vens despedir-te com um último beijo e vais trabalhar. Eu fingirei que ainda durmo. Penso em ti depois de saíres.

Penso na tua juventude. Na forma como ris. Na tua desenvoltura face a situações problemáticas. Penso no teu peito quando te ofereces a mim à noite, recolhidos no conforto do nosso quarto. Penso no teu sorriso, franco, aberto. Penso na tua voz docemente rouca. Penso na forma como te entregas com carinho e empenho em tudo na tua vida, na nossa vida. Penso que a ideia de te perder é insuportável. Penso que te quero hoje mais do que nunca, mas que tempos houve em que te repudiei e abandonei. Em que não te quis, nem a ti nem ao teu afecto, nem ao teu sorriso, nem ao teu corpo, nem ao teu amor.

E tu voltaste, ainda assim voltaste. Sem rancor, com o mesmo amor, com o mesmo sorriso, talvez apenas com um olhar mais triste. Abraçaste-me e nada disseste e eu chorei, chorei por ti, chorei por mim, chorei por nós. Chorei como a criança que sou. E o toque das tuas mãos nos meus cabelos, afagando-os, magoava.

Pouco antes do almoço telefonas-me a perguntar como estou. Contas-me mais um episódio caricato que presenciaste esta manhã. Depois despedes-te com um sonoro ruído. "É um beijo", informas-me entre gargalhadas.

Após desligar ando ainda um pouco pela casa. "Chaves, telemóvel, agenda... Tá tudo." Antes de sair olho para uma foto tua em cima de uma mesa alta de madeira e ferro perto da porta de entrada. Foi tirada há dois anos em Paço de Arcos. Nem sei o que fomos lá fazer nesse dia. Talvez almoçar. Quiseste uma foto no jardim que apanhasse parte do mar. Sorris vagamente para a objectiva. Os braços cruzados, como é teu costume. O meu boné enfiado na cabeça com a pala para trás. O olhar esquecido, perdido em algo que não sei o que é.

Saio, vou trabalhar, com esta ânsia de chegar logo a casa e encontrar a paz que é voltar para ti.
          Perdi-me... Deixei-me ir. Joguei-me fora. Esqueci-me de mim. Não quero lembrar. Quero esquecer todos os minutos do antes. Esquecer todas as experiências. "Nunca existiram", forço-me a dizer. Acredito nessa mentira, pois assim ser-me-á mais fácil acreditar no futuro que não vou ter. Deitei fora as emoções que não quero voltar a sentir. 
          A alegria será doravante falsa e o choro, lamento constante dos dias presentes, é um espinho cravado no fundo do peito.


          Terei existido alguma vez? E tu?

Sunday, December 9, 2012

Como desejei apagar a dor e o sofrimento que te assolavam em pesadelos mesmo quando acordado. O que eu quis entrar no teu coração e lá residir. E como ansiei pelo teu amor.

Eu convenci-me que te poderia salvar. Mas era eu, enredada nas teias da minha dispersão, quem urgentemente precisava de salvação. 

Os dois incompletos. Os dois sofridos. Os dois fragmentados. Que quadro triste. Que cenário desolador. Que realidade terrível. Que amor improvável.
"Eu sou verdade." - escapou-se-me pelos lábios subindo em espiral e dissipando-se junto ao teto. Os olhos inquisidores em frente não compreenderam e novamente  perguntaram. "Como?"
"Eu sou verdade." - repeti para me fazer entender. Mas apenas me fiz ouvir, novamente.

Friday, December 7, 2012

Já olhaste alguém nos olhos? E com esse olhar abraçaste, amaste e te  perdeste em mil sonhos e milhares de devaneios?

Tuesday, December 4, 2012

Quero
Quero encontrar um lugar no meu coração. Encontrar-me a mim. Encontrar um espaço infinito e um tempo paralelo. Quero encontrar um lugar no meu coração. Encontrar-te a ti. Encontrar nesse espaço infinito: amor, liberdade e generosidade. E nesse tempo paralelo viver o impossível com arrebatadora paixão, entrega e compaixão.
Quero
Quero encontrar no meu coração, lá bem fundo, no âmago do meu ser, um lugar onde não estou só, onde não me encontro perdida. 
E depois gritar
Gritar cem vezes que te quero, que te amo, que te trago dentro de mim. Que te cuido, que te prezo. Que em ti me estilhaço, multiplico e me eternizo.

Monday, December 3, 2012

VOZ VOZ VOZ



ouço uma música mas é como se fosse apenas o eco longínquo de uma outra 
                                                                                                                        outra música 
mais forte profunda violenta 
                                           um grito pesadelo que sai das profundezas e se manifesta 
Voz 
       és a minha voz
                              uma música melodia ditada na distância ainda leve murmúrio escutado
                              no longe fundo 
                                                      começa a mostrar-se um gemido leve
                              
ainda poucos a ouvem poucos estão atentos 
                                                          atentos atentos vivos para esta voz esta voz

minha voz

a minha voz é calada ainda agora se está a mostrar 
                                                                   
                                                                  tímida 
                                                                  em mim não se mostra não salta não se vê bem ainda 

não se sabe que ela existe ali, mas ela está aqui ali dentro de mim e quer saltar 
quer que a ouçam a vejam quer ser escutada a minha VOZ Voz Voa é uma melodia
um cantar distante mas belo muito belo que se vai ouvindo aos poucos...

uma música uma sinfonia um mar oceano um trovão a rebentar antes de se ver a luz do relâmpago um bramido na escuro diz 
                                            
                                               – aqui estou olhem ! 

conhece a escuridão o só, a noite negra e esta é a minha voz que sabe muitos nomes para solidão união, beija as coisas pequenas dá nome inventa palavra e constrói frases e mais frases 
escuridão dos momentos
momentos que poucos sentem...

a chamar a voz que chama profunda e só alguns ouvem, poucos ouvem. estou aqui é preciso falar mais alto, 
                                                       Voz!

VOZ VOZ VOZ está na hora
é momento de falar a voz alta

sair daqui dentro raiar
lançar ar dizer expressar... 
                                                       VOZ agora já te ouvem!

Tantas as coisas os mundos para dizer ao mundo...
mais mais mais mais muito mais que o silêncio escuridão 
... recostada no fim do tempo...
atenta mas calada sem som voz
                                                 agora é hora é a hora do som em terra nesta terra e bramir
                                                 berrar gritar uivar 
                                                                            rasgar o silêncio
                                                                            cortá-lo recortá-lo 

cortá-lo em pedacinhos aos milhões finos de areia 
o silêncio recortado no ar e escorrendo em sangue na terra 
                                                                       
                                                          vida voz vida voz a viva voz 

                                                          essa vida essa voz a viva voz 

                                                          um trovão rasga o silêncio 
                                                          rebenta
                                                          ultrapassa limites 
                                                          cria asas liberdade
                                                          ... e o mundo olha maravilhado 

                                                jorrando em palavras a torrente de cada silêncio
Foram-me prometidos sorrisos. Foram-me oferecidos sorrisos.
Foram-me levados esses sorrisos. Transformaram-se em esgares.

Sonhei que me davas um beijo: doce e longo. E de seguida com o olhar me despiste.

Sunday, December 2, 2012

Quando o sol mergulhou no mar os teus olhos disseram-me que não me querias mais.E eu achei-te cobarde porque foram os teus olhos e não tu quem o disse.

Saturday, December 1, 2012

"Em quantas palavras falsas já acreditaste?", perguntaste.

Quantos dos teus sonhos já se estilhaçaram? Quantos amores já viveste? E quantos perdeste? Quantas lágrimas já verteste? Quantos sorrisos já esboçaste? Quantos beijos já provaste? Quantos abraços já sentiste?

Quantas vezes quiseste sentir o que não sentias? Quantos corações já partiste? Quantas vezes desprezaste?

E quantas vezes, quantas vezes, já viraste as costas a alguém que te ama?

Quantas palavras já desperdiçaste?
Quantas vezes a ti mentiste?
Quantas vezes de ti fugiste?